quinta-feira, 19 de novembro de 2009

As duas culturas, de C. P. Snow

Recuperei o livro As duas culturas, de Snow. Li-o há uns seis anos, emprestado de uma amiga professora de Serviço Social. Julgava tê-lo devolvido. Reencontrei-o na semana passada, no fundo de uma estante. Com a existência hoje da Estante Virtual, encomendei dois exemplares (um para Carlos Ruiz), e já os recebi, cinco dias depois de concluir o pedido. É um livro pequeno, mas essencial, célebre, fruto de uma conferência proferida na Universidade de Cambridge (Inglaterra) em 1959. Snow trata, numa linguagem claríssima, de raciocínios retos e argumentação simples, da distância de percepções e de conhecimentos existente entre pesquisadores das áreas científicas e estudiosos das letras e da cultura. É leitura fundamental, para quem tem visto esse fosso se alargar sempre mais e mais, sobretudo pra nós, no Brasil e na UERN, que estamos no curso da construção da universidade como instituição especializada na produção de conhecimentos. Isto aqui não é uma resenha, é apenas uma nota para chamar a atenção de quem não conhece o livro. Muitas observações do autor, muitos aspectos de sua análise poderiam ser destacados. Não é o caso, aqui. O destaque que faço é para o fato de que a natureza humana é a mesma em qualquer latitude e em qualquer época. O que leva o debate acadêmico para direções que muitas vezes o negam. Veja-se o que diz Snow a respeito desse debate:
“Entre os comentários que se teceram até o presente, houve uma manifestação incomum que quero mencionar somente para tirá-la do caminho. Uma parcela pequena, muito pequena mesmo, das críticas veio carregada de injúrias pessoais em níveis anormais; na verdade, eram tantas num caso que as pessoas responsáveis por sua publicação em dois meios diferentes de comunicação me procuraram pessoalmente com o intuito de obter o meu consentimento. Tive de lhes assegurar que não pretendia propor uma ação legal. Tudo isso me pareceu bastante estranho. Em qualquer debate o normal é que surjam palavras duras, mas não é comum, pelo menos segundo a minha experiência, que elas beirem o limite da difamação.
No entanto, o problema de como comportar-se nessas circunstâncias é facilmente resolvido. Vamos supor que eu seja chamado, publicamente, de cleptomaníaco necrófilo (selecionei cuidadosamente duas alegações que, pelo que sei, não foram feitas). Tenho exatamente duas alternativas. A primeira, que em geral é a que prefiro escolher, é não fazer nada. A segunda é, se o aborrecimento se mostrar intolerável, processar o difamador. Existe uma alternativa que ninguém pode esperar de um homem são: isto é, discutir solenemente os argumentos, arranjar certificados de Saks e Harrods dizendo que ele nunca, de acordo com seu melhor julgamento, roubou um único objeto, obter atestados assinados por dezesseis membros da Royal Society, pelo chefe do Serviço Público, por um juiz do Tribunal de Apelação e pelo secretário do. MCC, afirmando que eles o conhecem quase a vida inteira e que nem mesmo depois de uma noitada o viram, sequer uma vez, espreitando as cercanias de um túmulo.
Não se espera uma resposta desse tipo. Ela nos rebaixaria ao mesmo nível psicológico do detrator. Temos o direito de evitar semelhante situação. Felizmente, o debate não será prejudicado se ignorarmos críticas desse teor, ou alguém associado a elas. Pois contribuições intelectuais que elas contêm outros já as fizeram, com educação e seriedade”.

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